Enquanto o incenso arde mil memorias me atravessam, mil desejos me consomem, mil luas me aguardam.
Enquanto o incenso arde mil noites parecem dias, mil pesadelos parecem sonhos, mil invernos parecem verões.
Enquanto o incenso arde os olhares tornam-se intensos, os beijos desejados e os toques sentidos. O amor torna-se real, a felicidade imaginaria, a realidade flutua na imensidão da ilusão.
Enquanto o incenso arde todos os cheiros se confundem, todas as vontades se misturam, todas as mortas verdades se esquecem.
Enquanto o incenso arde eu escrevo este texto e observo as intocaveis linhas paralelas do fumo libertado. São como duas vidas provenientes do mesmo espaço, arvores da mesma raiz, prevalecem lado a lado rodopiando entre si mas sem se cruzarem verdadeiramente, no ponto mais longinquo envolvem-se lentamente desaparecendo na imensidao tornando-se assim ar do mesmo ar, luz da mesma luz, agua da mesma nascente.
Quando o incenso deixa de arder pedaços de cinza permanecem, rapidamente se volta à realidade e a inspiração desaparece com o desvanescer da chama emanada, com o ultimo suspiro do fumo emitido.